terça-feira, 26 de agosto de 2014

POEIRA

                    A mulher passa o dedo sobre o piano fechado e mudo. A grossa poeira gruda em seu dedo indicador, há na poeira o indício do tempo, há no seu dedo fragmentos de passado. Com um pano limpo resolve retirar o tempo ali depositado em forma de fungos, bactérias e vestígios mortos. A música já não se ouve mais. Passa várias vezes o pano seco. Decide molhar com algo. Sem compasso. Lembra-se do óleo de peroba e volta a dar um brilho no tampo. Lustra. Acha que ficou embaçado e retoca com a flanela. Abre a tampa e vê as teclas amareladas, nada pode se fazer contra o amarelado da saudade.
          O piano continua em silêncio e a mulher também.

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