quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

CRÔNICA DA CRIAÇÃO


          O boia-fria naquele dia havia recolhido muito algodão. Estava cansado, muito mesmo. Na hora do almoço fugiu. Comeu primeiro e depois foi, a passos largos e compassadamente rápidos, para o lado do morro.
           Olhou para vista bela e escultural que as montanhas desenhavam no horizonte. Uma brisa bem leve arranhou suas feições. Resolveu deitar no chão-terra. Ali ficou. Pensava em nada. Duas nuvens brancas e fofas fizeram com que se lembrasse da colheita. Refutou. Ficava ali.
           Dois azulões passaram sobrevoando sua cabeça, disso ele entendia bem, sabia até que era um casal, a fêmea era marrom e o macho azul forte e vivo. Pensou, agora sim havia tempo para pensar, que era hora de se casar. De ter alguém com quem voar, de fazer ninho, produzir crias, duas ao menos; hora de deixar raiz por ali. Teria que procurar na vila uma mulher...
            Como em frames, os rostos das moças da fazenda e da vila foram passando emolduradas pelo céu azul. Não; não; não; não; talvez; nem pensar; sim! Lembrou-se de como ela dançava bem na Festa de São João. Era bem ajeitada de rosto e corpo. Quase não falava e pouco sorria.
            Passou toda tarde por ali, construindo um amor que antes nem existia...
             O Sol a pino já havia saído do prumo central e rumava para oeste quando ele se deu conta do seu desatino. Na mesma carreira em que veio, voltou para a colheita. Embrenhou-se no meio do algodão. Ninguém havia notado sua ausência.
            Colheu. Recolheu. Juntou. Tudo agora fazia mais sentido.
 

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

UM APÓLOGO LITERÁRIO


A poesia:

“Nasci para ser verso

Tenho rima na mão

Entoar violão, quero não

Cantarolar é mera ilusão

Sem melodia, sem som

Poesia muda, sou razão

Permito apenas ser...

Recitada na voz do poeta

Cantada, nunca, viro refrão!”

 

A canção:

“Inveja eu tenho não

Tampouco a solidão

Quero som do coração

Saída da voz entoada

Sou graça e perfeição

Transformo a calada

Num samba de cordão

 E ainda tenho parceiro

Meu amigo: o violão!”

 

 

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

SEM ROMANCE


Faz frio lá fora

Em mim o gelo é

Muito necessário

Os dias amanhecem

Sem muito Sol

E assim perco um

Pouco do meu juízo

Reconheço no livro

Deitado na cabeceira

Um desejo de ser lido

Faz frio lá fora e

Em mim esse frio é

Muito necessário

Não quis folhear as

Linhas da pequena

História de amor

Todos os romances

Resvalam no amor

E assim perco sempre

Um pouco do juízo

O dia amanheceu

Sem muito Sol e

Para mim o calor seria

Muito apropriado

Todas as histórias

Esbarram no amor

Em mim o amor seria

Muito necessário.

 

Faz frio lá fora...

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

RETROCESSO


Parte de mim retrai

Outra condensa e

Cuidadosamente

Afasta-se do Sol

Que já é tempo de

Molhar-se na chuva

Permitir que a gota

Caia em choro ou

Ainda em suor

Mas algo em mim

Retrai e condensa

É mais fácil cruzar

Os braços do que

Ver o Sol nascer.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

PAPO DE BÊBADA


Ouvi recentemente em um programa de culinária a expressão “é preciso tirar as mágoas das carnes”, aplicando-se para a situação em que se deixa de molho qualquer carne, de vaca, de porco ou galinha, em uma imersão de água com muita cachaça, para que só depois desse banho, a carne possa ser preparada e consumida.

A frase, segundo o que ouvi, é de origem escrava e achei tão linda e tão bela que não podia deixar de pensar sobre ela durante toda a semana. Divaguei tanto e pensei que muitas das vezes precisamos retirar a mágoas de nós mesmos. Nessa linha de pensamentos insanos e despreocupados com a razão, conclui que é por isso que nós bebemos.

Nada como um bom copo de destilados ou fermentados para tirar as mágoas de nossas carnes e almas. Percebi também, num fluxo de ideias sem fim e caótico, que nesses últimos tempos estava tomando minha dosesinha de vinho do Porto quase que diariamente, isto é, encaminhando-se para um vício prazeroso cotidiano.

Sem concluir nada de certo, por enquanto, refleti que pudesse eu, estar repleta de mágoas, já que a necessidade dos goles havia tornado-se um hábito rotineiro; estava na terceira garrafa em menos de dois meses. Matutei, busquei os meus rancores mais profundos, escarafunchei meus desgostos recolhidos, achei um ou outro, talvez tantas outras amarguras, porém nada de assustador.

Assim, depois de uma hora de molho, em pensamentos, regados por um cálice do meu vinho, percebi que lavo muito bem minhas carnes e almas de todas as mágoas, estou razoavelmente pronta e devidamente preparada para a vida; vida essa que não cansará de nos magoar, mas para isso eu já tenho a solução: beba com moderação!

domingo, 3 de fevereiro de 2013

PATENTE DE MÃE

felicidade é ver o filho
nascendo, crescendo
ganhar um beijo perdido
e desavisado
ouvir eu te amo
o primeiro pedaço
do bolo, do todo
os dentes rindo, rindo
o olhar da certeza, suave
e profundo
ser mãe é patente!

REGISTRO GERAL

Uma foto um número outro número uma mãe sem pai não declarado assinado com dedo de tinta. Agora é cidadão para valer!