segunda-feira, 18 de junho de 2018

SEMPRE SARAMAGO


RÉQUIEM PARA JOSÉ SARAMAGO

Faz pouco mais de um ano que meu escritor preferido morreu. Lembro-me de que no dia de sua morte, um amigo mandou por celular a seguinte mensagem: “Nosso Saramago morreu!”. Li a mensagem e comecei a chorar. Nunca tinha chorado por alguém assim tão distante de mim enquanto pessoa conhecida, mas chorava pela proximidade que sua obra enquanto escritor havia produzido na minha alma.

Nessa época, de sua partida, eu tinha acabado de ler um de seus últimos escritos A Viagem do Elefante mais do que nunca minha certeza era imensa em reconhecer o senhor de Lanzarote como o meu eterno escriba; suas singelezas, seu paroxismo, sua perplexidade diante das tamanhas injustiças do homem, esse homem cruel e ruim que além de tudo produziu um Deus.

Sim, José era ateu convicto, para ele “Deus é o silêncio do universo e o ser humano, o grito que dá sentido a esse silêncio”.  E prosseguia em mais críticas, adocicadas de ironias ao proferir: “Há quem me negue o direito de falar de Deus, porque nele não creio. E digo que tenho todo o direito do mundo. Quero falar de Deus porque é um problema que afeta toda a humanidade. Não sou implacável com ele, mas com a espécie humana, que inventou o Senhor”.

Mas, não era esse Senhor Saramago, crítico e ranzinza pelo qual me apaixonei por completo. Entreguei-me ao outro José, àquele das ilhas desconhecidas, das intermitências, dos ensaios, dos homens duplicados, enfim das pequenas memórias. Certa vez perguntaram-me, estupidamente, e claro nem me lembro de quem era a pergunta infeliz, como que uma professora de Língua Portuguesa gostava de um escritor que não usava corretamente as pontuações, respondi: Leia Saramago e depois nós conversamos sobre isso, às favas com as pontuações!

A minha profunda tristeza gira obviamente em torno de sua morte sim, porém muito mais, refere-se a minha impossibilidade de nunca poder ler aquilo que José Saramago não teve tempo de escrever. Vou ler novamente cada linha dos antigos, como se fossem novos e inéditos para mim, quem sabe minha saudade por ele diminui... “Não é ilusão do escritor que, ao concluir sua leitura, alguém alce voo e continue a expandir a constelação que viu impressa.”

sexta-feira, 15 de junho de 2018

QUINHÃO




Visita ao Centro de São Paulo. Hoje. Catedral da Sé, linda, exuberante, mas não serve para nada.
Ao redor, os desgraçados, mutilados, os sem-chance-de-merda-alguma, os famintos, os descamisados.
Olhei.
Olhamos.
Acendi um cigarro.
Acendeu o cachimbo.
A policía pass(e)ava por todos os lados, os caras olhavam o vazio, naquele passo a passo peculiar da lei. Qual?
Baforei, baforamos.
E ali deitado, junto ao pé de uma árvore, ali mesmo, perto do marco zero da nossa cidade, defronte a catedral da fé, o homem fedido, dividia a coberta com seu cão, enrolados em um só. Amor. Tem.
Senti. Sentimos.
Na volta, o molequinho sem-porra-nenhuma-de-sorte, enfrentava o destino, desprevinido, coitado, sem nehuma, mas nenhuma chance de ser feliz!
Restava-me escrever.
Escrevi.

terça-feira, 12 de junho de 2018

HOJE É DIA DOS NAMORADOS!

   Sentada em um banco a espera do ônibus que a levaria para a escola, a garota analisava a cena que via do outro lado da calçada. Girava a cabeça de um lado a outro para não perder nem um dos movimentos do casal, que se encontrava protagonizando uma conversa, cujo desfecho a menina estava ansiosa por saber. Tentava, vez em sempre fazer a leitura labial do que era dito baixo, porém conseguia ouvir quando um ou outro elevava a voz. O enredo inteiro não sabia dizer, mas ao certo sabia, que os dois discutiam um possível término de namoro. 
 Curiosamente a garota pensava no porquê os possíveis namorados estariam terminando a relação, e lembrou que era dia dos namorados. Pensou também que ela era ainda uma menina e meninas de onze anos não namoram...lembrou de sua mãe dizendo isso. Lembrou também que com essa divagação toda de pensamentos tinha perdido parte da novela de rua e continuou a observar o par que ainda discutia e gesticulava nervosamente, ele indo de lá para cá e ela abaixando a cabeça e enxugando as lágrimas. 
 Certo foi que o ônibus chegou e a menina não sabia se entrava, ou se esperava para saber o final dessa história. Entrou no coletivo, passou a catraca e correu para a janela. Abriu o vidro e gritou: Hoje é dia dos namorados! 
 O casal do outro lado da rua procurava de onde havia vindo o grito. A garotinha acenou para os dois de dentro do veículo que já havia partido. O casal sorriu. O casal acenou para a menina. O casal se abraçou. A garota sorriu.

terça-feira, 5 de junho de 2018

SILÊNCIO

Existem momentos, e não são poucos, que não se há nada a declarar, nada mesmo. Bom então, é dar um aceno para vida e pedir-lhe gentilmente que se aquiete sozinha...

REGISTRO GERAL

Uma foto um número outro número uma mãe sem pai não declarado assinado com dedo de tinta. Agora é cidadão para valer!