terça-feira, 30 de outubro de 2012

SER BANAL


Corpo caído

Trivialidade

Morte anunciada

Mais um, mais cinco, mais mil

Tanto faz, tanta gente

Morte premeditada

Platitude

Corpo abatido

Tanto faz, tanta gente

Nugacidade

Mais um, mais cinco, mais mil!

 

domingo, 28 de outubro de 2012

PONTO SEM NÓ


Quase todo o dia, a boa senhora tratava de bordar o paninho que daria de presente nas festas de fim de ano. Ponto de laçada. O rendado cuidadoso mesclava tons avermelhados idos do laranja ao quase roxo. Ponto de cadeia e entremeio. Nesse vai e vem dos ágeis dedos, lembrava-se de alguns sonhos, que agora eram tão vergonhosamente longínquos e estranhos que não eram possíveis nem de serem pensados. Ponto de cruz. Mais umas carreiras em círculos, com babados em bicos triangulares, deram forma aos panos, recém-acabados. Ponto de nó. Os sonhos? Guardou-os na caixinha, junto às agulhas e linhas coloridas, quem sabe amanhã... quem sabe!

sábado, 27 de outubro de 2012

FRINCHA


Deitada na terra batida

A menina olha pelo vão

Achando-se escondida

Espreitando de soslaio

Não querendo ser vista

Bate forte seu coração

Infância doce e simples

No apenas esconder-se

Turbilhão de emoção!

terça-feira, 23 de outubro de 2012

PNEUMOTÓRAX MODERNO


Lambuzam-te de gel,

enfiam-te goela abaixo

um canudo comprido.

Suspeitas daqui, evasivas dali, investigação, virose?

 

E é na incerteza da alma que o corpo padece!

sábado, 20 de outubro de 2012

BATE-BAÚ

O samba toca brejeiro,
as negras balançam os tornozelos
e o suor derramado deixa na Bahia o cheiro da saudade.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

OLHO ESQUERDO


É fim de tarde; o homem recebe um gesto carregado de imensidão que vem do abanar insistente da mulher que ele ama. Olha devagar e não retribui; entre eles há uma avenida repleta de carros, ônibus, motocicletas e gente, muita gente. Daquele lado de lá, a mulher procura, o sorriso é pleno, adocicado pelo entardecer que insiste em ofuscar a poluição. Do lado de cá, o homem, olha, ama, sabe e não abana nem um piscar. Entre eles, as buzinas de vozes e poeira, os cheiros da cidade, as sombras dos prédios sumindo na entrada da noitezinha que chega cansada do dia. Ele olha; a mulher se foi; ele suspira; ele ama; é fim; é tarde.

 

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

JOGO DE BÚZIOS


“Sua sina minha filha, eu vejo bem claro, é ser professora.”

“A senhora tem certeza?”

“São os Orixás que estão dizendo!”

 

domingo, 14 de outubro de 2012

GLOSA PARA GLÓRIA


Espanta-me a certeza

Da formosura e beleza

Sacodem a minha alma

Acolhem em pura calma

Embalam nossa história

Bela, doce e frágil Glória.

 

Quão estúpida cantoria

Sem a menor harmonia

Arruinaram sim vivalma

Estava na minha palma

Agora é pura braveza

Pela falta de destreza!

 

sábado, 13 de outubro de 2012

QUADRINHA EXÓTICA


 

O gatuno vestido de gibão,

Todo gaforina, grandíloquo

Cometeu a maior gafe: Fez

Glosa para a Glória errada.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

REDONDILHA BUCÓLICA


Outro de mim malquererá

Que o vento soprou suave

Melodias azuis em clave

Nessa sutil primavera.

 

Tranquilo já meu ser era

Pássaros piam conclave

Rosas cintilam no grave

E colorem a atmosfera.

 

Quanto de mim será mar?

Olho o místico luar...

Sensações agora mesmo.

 

Quanto aqui há de mirar?

Olho pujante a chorar...

Emoções confusas a esmo.

domingo, 7 de outubro de 2012

VIOLONCELO


Ontem meu sorriso foi-se amanhã

Brisa doce do teu olhar aturdido

Somente rancor profunda gadanha

Sabor amargo do ser iludido.

 

Se a tristeza soubesse meu nome

Saberia como peito dói ora range

Como nem o luar é meu cognome

Finda amor e nem som mais tange.

 

Esse amoroso antes tão apenso

Agora morto sofre mor intenso

Mutilado meu corpo é fustigo.

 

Os lábios padecem esperando

Os olhos compassam lembrando

Que a vida trouxe-me como castigo.

 

 

 

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

HIPOTECA


Hoje você percebeu que errou. Viu que aquela pessoa não era tão ruim assim, ou que o dia estava mais belo como o de costume, e que não era tão vil e mesquinho, ou austero e orgulhoso como pensaram. Hoje decidiu que era tempo de ser mais leve, mais doce e brando, menos apegado a toda essa gente, a todas as convenções. Que sorte a sua ao perceber o olhar amistoso daquele que passava e dar adeus às moças e rapazes; dizer um bom dia e outros tantos obrigados. Foi bom ter visto que é tempo da temperança. Deixou de lado as vingancinhas idiotas,ironias, hipocrisias e tratou de cuidar da sua alma, que agora está tranquila e não mais tomada por empréstimo para o seu ser confuso e hostil. Muito bem, o mundo está feliz em vê-lo assim. Resolveu que era hora de olhar para frente, para os lados e para todas as direções. Que deixaria para lá, lá distante, o que quer de sério e de transtorno; e passaria a flutuar pela vida, livre, sem receios, sem constrangimentos, sem precisar transferir títulos ou posses, ou qualquer bem...para ninguém.

 

REGISTRO GERAL

Uma foto um número outro número uma mãe sem pai não declarado assinado com dedo de tinta. Agora é cidadão para valer!