terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

DIÁRIO INACABADO


Pela manhã o lixeiro passa e cumpre seu trabalho de coleta. O lixo não lhe diz nada, é apenas fétido e não reclama por ser pego. O engenheiro nessa tarde, atrapalhado pelo ferro dilatado e retorcido, altera os planos; talvez esse tenha sido o jeito do ferro se vingar. E assim em qualquer dia, os vários profissionais lidam com seus objetos de trabalho e cumprem aquilo que algum dia, alguém lhes prometeu que seria dignificante.

Há dezessete exatos anos leciono. Meu objeto de trabalho são crianças e adolescentes, pessoas em formação. Recebo para instruir, transferir conhecimentos, construir cidadania, formar opiniões as mais diversas possíveis, possibilitar escolhas através do estudo das variadas Ciências. Recebo para mostrar que são inúmeros os caminhos, para estimular a criatividade, para sanar as dúvidas, para corrigir os equívocos que fugiram às regras, para acolher. Recebo para preparar textos, aulas e provas. Preencher diários, corrigir redações e cadernos; para responder bilhetes, aconselhar e ouvir pais, alunos. Recebo para ter uma paciência infinita e incomensurável.

Antes de ser um desabafo panfletário ou ainda discurso apelativo, o que me proponho a dizer nesse texto é que lecionar deixou de ter sentido em nossa década e tende a ficar pior. O meu “objeto” de trabalho recusa-se a cooperar e a função do professor está cada vez mais desnecessária. Acredito realmente que seremos substituídos por Tablets, robôs e afins e penso mesmo que se faz urgente essa mudança. Não há mais nenhum brilho na relação professor-aluno, não há bons professores por causa da péssima formação que é inexistente no mercado futurista em que estamos.

O que vejo é uma série de equívocos, desrespeitos, angústias, desvalorizações, descompromissos, omissões; e tudo isso é regado porque deixamos de ter um trabalho, o que temos é um emprego, como outro qualquer, cujo objeto, antes de ser fétido ou magnético é pensante, e faz o que quer, realmente faz o que quer. Prefiro pensar que meu tempo está no fim, e que tive nesses longos anos várias alegrias dentro das salas de aulas, imensas gratificações pessoais de alunos que perceberam e reconheceram o meu TRABALHO.

 Na realidade estou cansada, muito cansada e por mais confuso que possa parecer, termino essa constatação com uma réstia de esperança. Tomo por empréstimo um trecho da doce e brilhante Adélia Prado: “Eu sempre sonho que uma coisa gera, nunca nada está morto. O que não parece vivo, aduba. O que não parece estático, espera.”

domingo, 26 de fevereiro de 2012

POLIFONIAS

         Os vários prismas quebraram-se em miúdos pedaços que caídos, pulverizaram uma enorme plantação de palavras.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

SAMBA DA DESILUSÃO II /Versão musicada


(Marili Santos/Gabriela Santos)



Se o tempo de nós fugir

E cancelar nosso encontro

Um novo dia há de surgir

Para reparar nosso engano



Já cansei de brincar

Preferia o esconder

Quero o pega-pega

Onde me vejo com você



Joga a peteca prá lá

E faz o tempo girar

Cada minuto só permite

Um olhar.


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

SAMBA DA DESILUSÃO


Se o tempo de nós fugir

e cancelar nosso encontro

um novo dia há de surgir

para reparar o grande erro



De esconde-esconde

já cansei de brincar,

quero o pega-pega que

faz o tempo girar, girar.



Joga a peteca prá lá,

Joga a peteca prá cá,

com o tempo não se brinca

nem de escravos de jó!


quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

CATILINÁRIAS


Vozes d’alma

Copos d’água

Livros d’deuses

Amores d’uns

Após’trofo

Após’trofe

Oh! Quanta inquietude, Deus meu!

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

EUFONIA


O verbo ficou calado

e sofreu séria defecção.

Além disso, teve uma baita

síndrome do pânico e não

pôde mais ver um sujeito

pela frente; ficou unipessoal!

Deixou várias lacunas

em sua vida e agora só

 é conjugado na poesia.

“De tarde anoiteço”, para Vinicius;

“De noite amanheço” para Marili.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

TERQUEDAD


Mira la perseverancia y

com el passo del tiempo

firme em la constancia,

en la base de la obstinación.

Cambia frenéticamente su

vida estampida y puesta

al principio del acaso para

que tengas siempre las

delicadezas en palavras...

y acciones.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

QUIETUDE


O céu colorido

abriu  hoje o dia

lindo e contemplativo;

pela manhã alaranjada,

fresca e risonha

os pássaros passeavam

combinando diversas

matizes pelo ar.



Durante a tarde,

com o tempo já

esmaecido e tomado

por nuvens insistentes

que perfilavam afim de

tramar uma chuva brava,

o céu acinzentado e acinte

rejeitou-se a ceder...



Abriu-se novamente

em clareira azulada;

e agora na tardezinha

que aprumava levemente

lilás, doce e prazenteira,

o dia pode despedir-se em paz.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

CRÔNICO (A)


Abri um livro de gramática para atualizar uma regra de vírgulas, sempre odiei e errei o uso da vírgula, e num dos exemplos de ponto-e-vírgula, deparei-me com uma frase de Rubem Braga que se tornou o mote desta crônica. Ei-la: “Essas coisas me fazem lembrar outras, também ásperas e tristes; estou num dia de lembranças ruins. Quando vejo moços a falar do tédio da vida, tenho inveja; nós nunca tivemos tempo para sentir tédio.”.

Das várias definições para tédio que conheço, nenhuma consegue dar conta da sensação que eu sinto. Uns apontam como o cansaço da alma, aborrecimentos e melancolias, falta do quê fazer, sentimento de vazio interior, e diga-se, tudo sem a menor explicação, muitas das vezes. O tédio assim como chega, sai.

Minha relação com o tédio beira a loucura. Faço tantas coisas que quando sinto o desejo do ócio, paradoxalmente ele transforma-se em vazio, aborrecimento. Machado de Assis dizia: “Matamos o tempo, ele nos enterra”, mas todos eles tinham muito mais tempo que eu. Queria poder matar o tempo sem gerar tanta culpa, deitar sem nada para fazer e não sentir tédio por isso.

O problema está nas definições. Todas elas não dão conta da complexidade do assunto e são incapazes de definir meu estado de espírito. Se para Machado não há o ócio e para Braga não existe o tédio, ambos caminham na minha vida em uma estrada circular e contínua...

Será que usei certa a regra da vírgula?

sábado, 4 de fevereiro de 2012

ESCOLÁSTICA


Há alguma confusão em mim

que em hora incerta manifesta-se

em pedido ou dúvida, abrigo ou descuido.

Já não sei como esse Deus me olha,

se ao cair do dia suplico e quando

chega madrugada, renego.

Há fé.

Há incerteza e melancolia,

e nosso diálogo é conturbado.

Não vejo precisar do perdão;

não vejo necessitar da benção;

quero estar sujeita ao acaso das

minhas frágeis práticas da inveja,

da cobiça, da gula e prazeres ásperos.

Se há o bem, enxergo meu ser nele

também, estou à mercê da bondade,

das gentilezas e dos amores amigáveis.

Há ceticismo.

Quero hoje pensar feito a criança

que nada pensa ou questiona e

está livre de Deus, mas cercada por todos os anjos!


quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

FIM DO MUNDO: PROFECIAS DE UMA MÃE




Nessa manhã meu filho pequeno de idade, mas imenso de sabedoria, ao ler meu Poemeto (Perguntou-me se existia essa palavra e mostrei-lhe o dicionário) disse por que eu não escrevia sobre o fim do mundo. O diálogo seguiu dessa maneira:

- Tudo bem escrevo, mas você acredita que o mundo irá acabar?

-Claro que não. Não por causa das profecias. Mas sim por causa do máximo solar.

- Máximo???????????????(Nem me atrevo a perguntar) Acabaria por conta de quê? Meteorito.

- Não mãe, meteorito é um pedaço do meteoro. Acabaria se algum meteoro caísse e vai cair, só resta saber quando. Mas vai demorar eu acho.

- E o fim do mundo que estão anunciando para dezembro?

- Só acabaria agora nesse ano por causa das pessoas histéricas que acreditam nisso.

-Ah! Entendi. Valeu.

E assim como veio saiu. Pensei em como eu iria escrever sobre o fim do mundo depois dessa pequena aula do garoto de nove anos. Decidi então que só poderia desejar imensamente que o mundo, esse mundão, esperasse o Guilherme chegar, esperasse ele crescer e viver. Sinto que ele já faz toda a diferença agora imagine daqui a algum tempo...

REGISTRO GERAL

Uma foto um número outro número uma mãe sem pai não declarado assinado com dedo de tinta. Agora é cidadão para valer!