A pandemia me trouxe uma lição: a vista e o ângulo das coisas
não são nunca iguais. Dito isso, creio que fica bem à mostra, que o que se vê é
sempre o instante, talvez também seja o que se fala. Mudar de opinião é moleza
em tempos de reclusão, de resguardo sem ter parido e de cárcere domiciliar. Dito
isso também, o mote dessa crônica não é político, embora talvez até sirva, não
é pandêmico, o que move esse assunto é o olhar.
A vista ora cansada de não ver o que de costume era, passa a
mirar o estranho, o belo, o esquisito. E antes, como não havia tempo para isso,
olhávamos sem ver. Sempre havia visto as aranhas, nem sei se gosto de aranhas,
porque jamais havia pensado nelas dessa maneira. O fato é que estava tomando um
banho de Sol e pensava nos presos que tomam esse mesmo banho, e eu pensava no
que eles talvez estivessem pensando; enfim, decidi tirar uma foto do ângulo do
céu que se formava junto à cumeeira.
Tirei.
Ficou razoável para quem é bem amador nisso. Virei o rosto e
lá estava a minúscula aranha. Olhava para mim, eu creio, e estava a centímetros
do meu cabelo. Desviei com calma a cabeça para que pudesse vê-la inteira.
Tirei.
Ela andou e tirei
outra. No que ela, aranha pensava, eu realmente não sei, mas, sei no que eu
pensava. Pensava que temos a vista cansada, que o estamos vendo agora é só
instante, sim nossas vistas estão muito cansadas, e agora estamos muito
diferentes, muito mesmo, do que éramos.
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