terça-feira, 24 de janeiro de 2017

URDIDURAS-Um conto inacabado

Capítulo 9
A estradinha de terra ainda cheirava o úmido orvalho da noite anterior. Antônio ia por ela mais pensativo que de costume, pois a visita do filho, a imagem das folhas secas e todos os acontecimentos últimos, haviam tomado uma forma estranha em sua cabeça.  Forma de nuvem em pequenas bolas, que ora dispersavam, ora eram para chuva.
Na cancela, que abria e fechava, um hóspede puxou certa conversa enquanto tentava um entrosamento com o cão bege. Perguntou se sempre morou na região, se tinha filhos, se o cão tinha nome. Investigou o que queria e se foi. Mas o estopim daquela conversa não foram as perguntas sabatinadas feitas ao homem da cancela e sim, como Antônio se sentiu ao respondê-las. Se antes sua cabeça girava em turbilhões, agora eram imensas tempestades de dúvidas, desejos, e vontades estranhas.
Desejou ter sido jardineiro, e relembrou todas as plantinhas que haviam sido enterradas no quintal de sua casa. A mãe chegava com a muda no saco preto e entregava para o menino, que já não era mais ele, o moleque tirava com o maior cuidado, porque havia aprendido com a mãe essa delicadeza do plantio, arranhava os dedos na terra e fazia o buraco. Guardava a raiz lá dentro e ajeitava a terra ao lado, em montinhos. Sentava ao lado e ficava olhando para a mudinha verde e quieta. Ficava a manhã toda ali, até o pai chegar com um safanão a lhe pedir que fizesse alguma coisa ao invés de ficar ali plantado.
Na volta, pela mesma estrada de tantos anos, de imensas idas e vindas, de tanta poeira levantada o homem sentiu uma profunda e irrefutável sensação de mudança. Como se quisesse trafegar em novas terras e caminhar por outros rumos. Plantar novas mudas. E assim, desses rompantes é que surgem as ações que nos levam para lá ou para cá. São essas dúvidas somadas às angústias da alma que nos fazem agir. Não estava ainda bem certo o que o homem faria, porém alguma coisa ia mudar. O cão bege vinha ao seu lado no mesmo compasso de sempre.





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