domingo, 3 de julho de 2011

CRÔNICA DO ENTENDIMENTO


Nas minhas tantas tentativas de acabar com o sedentarismo, passei a caminhar pelas ruas do bairro onde moro. A caminhada serviria para espairecer, desanuviar, não pensar em nada, além de eliminar meus quilos teimosos. As casas passavam por mim e em apenas dois dias havia a predileta, a que jamais moraria, as reformadas, as descascadas. Já sabia dizer quais os cachorros que latiam exageradamente quando eu passava e os que nem ligavam permanecendo ali deitados para o mundo.

Nessas idas e vindas diárias passei a reparar também em um senhor negro, vestido com um terno cinza escuro, as calças seguradas por um cordão, sapatos sujos, que varria a calçada com uma vassoura estranhamente improvisada de grandes folhas, amarradas pelo mesmo cordão das suas calças. Na ida, juntava as folhas e flores num montinho, na volta, estava agachado na guia fumando seu cigarro. Olhei bem para seu rosto escravo, diminui o passo, ganhei uma boa tarde que grosseiramente não respondi.

As casas e os cachorros já não mais faziam parte do meu cenário, caminhava pensando naquele senhor que todos os dias varria as calçadas, juntando folhas, que era, ou não, o possível a ser juntado. Passava por ele e sempre eram movimentos tranquilos, os montes formados quase que desenhados naquelas calçadas. O cheiro de um cigarro de palha, o terno, o rosto escravo, as folhas...

Num outro dia urinava escondidinho perto de um terreno baldio. Naquela semana passei por ele com o propósito de dizer bom dia e pude ver sua velhice, sua boca sem dentes, sua entrega á inalienabilidade, sim porque seu olhar estava parado no tempo, no seu tempo, era um olhar que nunca mais esquecerei, pois dimensionava o eterno e o intermúndio.

         No dia seguinte não mais caminhei.

5 comentários:

Fábio Roberto disse...

Perfeito! Leandro e eu temos dúvida se esse senhor realmente existe em carne ou é um espírito. Ao contrário do ocorrido com você, quando eu passeava com os cães ele sempre me cumprimentava.Quando passei a caminhar sozinho nunca mais me olhou. Acho que também não sabe se sou de carne um espírito...

Valsa Literária disse...

VOCÊ ANDA ME SEGUINDO SR. FABIO?????

Fábio Roberto disse...

Você anda no meu território, minha área de domínio, portanto cobrarei pedágio!

Fábio Roberto disse...

Podou o comentário do Leandro. Como é que as pessoas vão comentar assim?

Valsa Literária disse...

Que comentário que eu podei????
Publiquei todos que haviam.

DOIS AXIOMAS RALÉS

  AXIOMA AMOROSO Entender o outro É respeito Aceitar o outro: amor.   AXIOMA REVOLTO Ahhhhhhhhh! Ignorância É a matriz da acei...