terça-feira, 3 de abril de 2012

A VELHA E O SORVETE


Há momentos na vida que temos uma saudade tão incrivelmente melancólica da nossa infância que lembramos até dos detalhes mais sutis, do cheiro, da cor, do gosto perdidos e gastos pelo tempo, e recuperados no túnel da memória por algum motivo.

Parada no carro, esperando meus amores chegarem do metrô vi passando uma velha. Era bem velhinha mesmo, estimo uns quase oitenta, cabelos totalmente brancos, guarda-chuva em punho aberto para guardar o Sol do meio-dia, saia godê de lã cinza, deixando as canelas vistas, blusa de linho bordada delicadamente, umas sacolas dependuradas no braço e na outra um sorvete.

O sorvete daqueles de casquinha de cone, com duas bolas imensas, penso uma de creme e a outra de morango. A senhora caminhava devagar e ritmada, ao certo para não derrubar nada. Sorvia o gelado como se fosse o último a ser tomado por ela. Seu rosto era de pura felicidade com um misto de sacanagem do prazer proibido.

Passou, e assim que cruzou por mim deixou-me um rastro da saudade. Lembrei-me da minha avó Helena. Era louca por sorvete. Íamos até a sorveteria da cidade e comprávamos oito, nove bolas de sorvetes de frutas, abacaxi era o preferido, cheios de pedaços. E ficávamos geladas na alma. Tive tanta saudade que senti o gosto, o cheiro, da minha avó, da cidade de Lorena e principalmente de mim.

Um comentário:

Anônimo disse...

Legal!

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