sábado, 14 de maio de 2011

A FACE AZUL

CAPÍTULO 5

Dona Maura tinha afeto suficiente para abraçar a menina desconhecida, com o mesmo amor, ressentido sim, que abraçaria a sua irmã Miriam, agora, com a face azul só existente na lembrança das duas. O instante foi duradouro e carregado de sentimentos inexplicáveis e confusos.
Levou a moça para dentro e guardou seus pertences no quarto do filho que já não morava mais lá. Fez um bom café para Luzia e trataram de conversar sobre tudo que havia acontecido. Encheu a menina de perguntas, a vida no interior, a ausência de Miriam nesses anos todos, o pai desconhecido, as dificuldades financeiras e a perdas.
Maura contou também sua história, de seus filhos, de seu marido, da sua rotina diária. Disse coisas do passado também,  a vida das duas irmãs,  a proximidade e de como tinham se afastado. A garota ouvia  com olhares de dúvida. Não imaginava o que seria tudo de agora em diante, com essa senhora desconhecida, em uma casa e um lugar que não lhe pertenciam.
Enquanto a mulher, mergulhada nas reminiscências, falava e falava, Luzia pensava que não era ninguém,  não tinha mais nada a perder e em como a vida lhe propusera esse mar de indefinições e tristezas. Lembrou que não chorava faz tempo e que também não sentia vontade nenhuma de chorar.
A tia conversou tanto em seu monólogo, que não percebeu que a hora do almoço se aproximava e que não havia feito nada. Ficou tão atordoada, que passou a descascar as cebolas numa rapidez doentia. Luzia começou a ajudar e seguia as ordens de Maura, que notou na sobrinha um expediente enorme. Em cerca de meia-hora haviam feito quase todo o almoço.
Seu José chegou antes de Paula. Soube da história toda em apenas dez minutos. Olhava para a menina, olhava para a esposa e não dizia uma palavra. Paula chegou em seguida para almoçar. Ouviu a mesma narrativa. Abraçou a prima, disse que era muito bem vinda, mostrou a casa, seu quarto, emprestaria suas roupas, sairiam juntas, conheceria seus amigos, a cidade. Tudo soava falso e exagerado, mas Ana Luzia não percebeu nada. Maura colocou o almoço na mesa e tratou de falar.
Todos ouviam uma mulher diferente. Cada um pensava consigo o que a chegada dessa criatura nova mudaria em suas vidas. Paula na alforria, José nas despesas e Luzia na incerteza. Uma coisa era certa... As mudanças seriam tantas na vida daquelas pessoas que talvez elas nem imaginassem isso agora.

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