segunda-feira, 2 de maio de 2011

A FACE AZUL

CAPÍTULO 2
Na rodoviária, ia comprar a passagem quando o velho vendedor perguntou se a garota ia viajar sozinha para São Paulo e garantiu que sem autorização não ia não. Luzia disse ao homem que era para sua mãe; “eu só vim comprar”, repetiu firmemente. Pensou em como faria para embarcar. Foi até o banheiro, trocou as calças por saias e meias, uma blusa de renda e xale. Prendeu os cabelos e passou o que tinha de batom nas bochechas. Olhou para a foto do RG da mãe e sentiu-se igual.
         O dinheiro enfiado nas calcinhas incomodava até na hora de dormir. Na primeira parada do ônibus decidiu descer, tinha medo, mas tudo aquilo era tão automático como se ela já tivesse feito. Não olhava para ninguém, não falava com pessoa nenhuma, agradeceu várias vezes por ter ao lado da poltrona uma mulher esquisita e quieta. Arrumou o dinheiro todo e colocou outra calcinha por cima, para firmar as notas.
         Tinha medo de dormir. Olhava para a escuridão sem fim da janela e da estrada, sabia que estavam perto de alguma cidade quando as luzes se aproximavam. Cochilava e acordava assustada. Comeu todas as balas de leite do saco na tentativa de permanecer acordada. Sonhou com o rosto da mãe que lhe sorria e abanava dizendo adeus. Luzia corria de encontro á mãe e ela repetia que estava bem e que sua vida daria certo. No sonho, tentava pegar na mão da mulher de faces azuis e não conseguia...
         O solavanco do ônibus parando acordou a moça. Luzia olhou para a janela e viu uma cidade cheia de carros e cinza. Apalpou sua saia e viu que sua bolsa estava no chão. Verificou que tudo estava em ordem. Imaginou que tudo aquilo era São Paulo. A mulher do lado ainda estava de olhos fechados. Ana pensou que ela tinha morrido e esbarrou no cotovelo, a senhora olhou feio e virou o braço para junto do corpo.
         Nunca havia visto tanta gente junta. Ficou com as duas malas, encostada no canto da grade da rodoviária. Precisava pensar. Olhou o endereço e tentou memorizá-lo. O que faria? Sentiu que a insegurança dos seus quinze anos não permitiria que fosse até o fim. Pegou o metrô e achou tudo muito interessante. Fazia uma cara de paulistana de volta á terra natal. Não olhava para ninguém, já pertencia á cidade.
         Desceu na Barra Funda como dizia o bilhete de sua mãe. Pegou um táxi e falou o nome da rua como se já o soubesse de outros tempos. O taxista puxou assunto e não obteve resposta, apenas um meneio da cabeça. O carro parou de frente a uma casa bem bonita. Luzia conferiu o número e o nome da rua, e viu que estava certo. Pagou o homem e desceu.
         Ficou ali por quase meia-hora sem coragem de tocar a campainha. Quando tocou, uma mulher de meia idade muito parecida com sua mãe abriu uma parte do portãozinho, com a cara para fora perguntou o que era.
– Dona Maura?
– Sim, quem é?

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