terça-feira, 11 de setembro de 2012

UM SONHO APENAS


 CAPÍTULO SEGUNDO

“Que há entre a vida e a morte? Uma curta ponte. Não obstante, se eu não compusesse este capítulo, padeceria o leitor um forte abalo, assaz danoso ao efeito do livro. Saltar de um retrato a um epitáfio, pode ser real e comum; o leitor, entretanto, não se refugia no livro, senão para escapar à vida.”

            Jonas fechou o livro sobre o regaço. Relia Brás Cubas. A frase o havia irritado, incomodado, não pelo fato de nas últimas duas semanas ter lido e relido seus romances favoritos, mas certamente pela veracidade dela. Imaginou o que escreveriam em seu epitáfio e riu. “Oremos pelo velho e bom Jonas Matos Silva, bom pai, bom homem, trabalhador digno, fiel cidadão boraense, deixa saudosos filhos, netos e bisnetos”. Riu. “Muito longo, ia ficar caro.”

            Se pudermos dizer que a vida dele foi a mais comum, é verdade. Casou-se duas vezes. A primeira quando ainda morava em Tupã, sua cidade natal. Lá criou e educou os filhos, trabalhando como delegado. Sua remoção para a cidade de Borá deu-se nos anos noventa. Sua mulher havia falecido e seus filhos já tinham ido para São Paulo. A ideia da remoção para outra cidade pareceu-lhe boa. Uma semana depois de instalado, diante da morosidade da cidade, casou-se com Adelina.

            Adelina foi uma boa companheira, mesmo diante da rapidez do encontro, arranjado e acordado pelos dois, ambos queriam por fim á solidão. Ficaram apenas sete anos juntos- tempo também suficiente para que o Senhor Jonas fincasse raízes de fato naquela cidade. De lá não sairia mais, disso ele mesmo sabia. O que se pode dizer é que tinha boas lembranças da sua vida. Nada tinha dado errado, umas ou outras coisinhas, nenhuma tragédia, nenhum grande sofrimento. Uma boa vida.

            Talvez tenha sido tudo isso que tivesse parado os pensamentos do velho homem naquela tarde. A retomada de lembranças e a percepção de que aquela pessoa nunca havia ousado nada. Tudo, absolutamente tudo tinha sido perfeitamente normal. Sua profissão, seus casamentos, sua conduta moral e até religiosa, simples e tradicional.

            Com o livro ainda sobre o colo, ele cochilou. Sonhou que estava num bordel. Duas mulheres peitudas acariciavam seus cabelos. A música era um jazz arrastado, o cheiro de bebida era forte. Em sua direção vinha outra mulher. O perfume dela era delicioso, mas ele não via seu rosto. As duas outras se afastaram ao sinal daquela que vinha. Ele não via seu rosto. A mulher sentou-se em seu colo e o beijou.

– Seu Jonas acorda, acorda...

 

2 comentários:

marly disse...

marli, não dá para escrever tudo de uma vez?, é para deixar o leitor com mil pensamentos...será que ele tem um sonho que nunca se realizou? ai,,,só amanhã....o jeito é esperar.......my

Valsa Literária disse...

HAHAHAHAHA ADOREI DIZEM QUE A PARTE MAIS DIFÍCIL PARA UM ESCRITOR É A CRIAÇÃO DA EXPECTATIVA: EI-LA!
BJS

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